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OuremReal

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29.09.23

Nós, migrantes


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O Município de Ourém subordinou os três dias do festival cultural deste verão de 2023, que decorreu na vila medieval de Ourém, ao tema “nós, migrantes” pondo em destaque o contributo que os oureenses têm dado para a divulgação e conhecimento do nosso concelho e das nossas gentes por todo o mundo. De tudo o que foi referido e mostrado e que tive a oportunidade de presenciar, chamaram-me a especial atenção quatro aspetos:

1 - A exposição fotográfica de Gérald Bloncourt que mostrou parte da realidade vivida pelos emigrantes portugueses que, principalmente, nos anos 60 do século passado, saíram de Portugal, rumo a terras francesas, na busca de uma vida melhor e outras condições que a miséria que viviam no seu país lhes negava.

2 – A variedade gastronómica proporcionada pelos diversos stands representativos de lugares e países onde chegaram os nossos conterrâneos, sempre na procura de melhores condições de vida, com destaque para as mostras gastronómicas não só de França, mas também do Reino Unido, Brasil, Angola e Moiçambique.

3 – A apresentação do livro intitulado “ Como o fumo do comboio” do escritor oureense José Carlos Godinho, ele próprio um imigrante, ainda jovem, em terras francesas na década de 60 do século passado.

4 – As palavras do Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, Francisco André, um oureense em funções governativas e que, por essa mesma razão, tem largo conhecimento da vida e dos trajetos de emigrantes e imigrantes, e em particular dos seus e nossos conterrâneos.

Quanto à exposição fotográfica, que não constiuirá uma novidade para quem viveu ou, de alguma maneira, acompanhou aquela época, servirá, principalmente, para as gerações posteriores poderem avaliar a vida de sacrifício de seus avós, ou pais, nalguns casos, que, na sua grande maioria, tiveram uma vida tanto ou mais miserável do que aquela que tinham quando partiram, deixando as suas famílias, mas com uma grande diferença: por cá, viviam mal, sem grandes, ou mesmo nenhuns bens e sem dinheiro; lá, viviam mal, em péssimas condições muitas vezes, mas com remunerações que lhes permitiam enviar à família algumas remessas, de tempos a tempos e proporcionar aos seus algumas condições de vida que antes não tinham; para além de poderem amealhar algumas reservas para garantir o futuro, quando, anos mais tarde, voltassem às suas origens. Era por isto, foi para isto, que muitos se sacrificaram e, para a grande maioria, terá valido a pena.

Mas houve outros migrantes, muito mais jovens que aqueles, eles que também emigraram e, quase todos, por razões diferentes, pensando sempre em outros aspetos da vida, animados por ideais mais políticos do que meramente económicos, por inconformismo com a situação política que então se vivia e, principalmente para fugirem ao cumprimento do serviço militar que , na maioria dos casos, conduziria a uma participação na guerra colonial. E, por isto e não só para perceber o quotidiano da emigração em geral, também vale bem a pena ler o livro “como o fumo do comboio” e perceber o que isso significa, ou significou, para uma boa parte desses jovens que, levados pela utopia da sua juventude, concluiram, anos mais tarde, que aquilo com que sonharam, afinal, não passou disso mesmo - “utopia”, e no seu regresso a Portugal, quando aconteceu o 25 de abril de 1974 e a guerra colonial acabou, constataram que os acontecimentos acabaram por tomar um rumo diferente daquele com que sonharam, vendo os seus sonhos esfumarem-se “como o fumo do comboio” tendo, grande parte deles, caído no desalento, voltando aos lugares onde tinham sido “felizes” e por onde muitos foram ficando, nem sempre tão felizes como sonharam ser.

Foram três dias interessantes, os deste festival cultural! Que deram para meditar e comparar o antes e o depois! Pelo menos para quem gosta de pensar e tirar conclusões!

Interessantes, também, as palavras do S.E. dos Negócios Estrangeiros, ao dizer que: “ Segundo os mais recentes dados, os cidadãos naturais do concelho de Ourém a residir no estrangeiro ascendem a 12000, espalhados por 36 países. Esta dissiminação e a cada vez maior representação em cargos de relevo em todo o mundo, enriquece e dignifica muito a nossa matriz identitária”.

 

O.C.