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OuremReal

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21.01.16

A subvenção vitalícia


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De repente, parece que toda a gente ficou escandalizada com a “imoralidade” da “subvenção vitalícia” atribuída aos detentores de cargos políticos, como se se tratasse de um assunto novo, como se nunca tivessem ouvido falar em semelhante coisa. Foi, apenas, preciso que, em plena campanha eleitoral para a Presidência da República, alguma comunicação social achasse por bem colar a dita “imoralidade” a uma das candidatas aquela eleição, só porque ela foi uma das 28 pessoas que assinaram um requerimento para que o Tribunal Constitucional se pronunciasse sobre uma norma do Orçamento de Estado de 2015 que condicionava a atribuição daquela subvenção, para que uma avalanche de comentários, críticas, acusações e outras manifestações inundasse noticiários, telejornais, debates e redes sociais. Uma vez mais se provou como as nossas opiniões e decisões podem ser condicionadas por interesses alheios.

Como se sabe, a subvenção vitalícia para detentores de cargos políticos, nomeadamente, Presidentes da República, membros de governo, deputados, juízes do Tribunal Constitucional (mais tarde este âmbito foi alargado), foi criada com a primeira publicação do “estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos” através da Lei 4/85, de 9 de Abril, que, no seu art.º 24º estipulava que os que tivessem desempenhado o cargo durante oito anos tinham direito a essa subvenção. Já se passaram 30 anos e, ao que parece, nunca mais ninguém se tinha lembrado disso!

Dez anos depois, a Lei 26/95, de 18 de Agosto, alterou o período de tempo para doze anos e introduziu o chamado “subsídio de reintegração” que se aplicava aos que não tivessem conseguido completar aquele tempo no cargo. Estes teriam direito ao tal subsídio e que se traduzia no pagamento duma remuneração mensal, igual ao vencimento que tinham, durante tantos meses quantos os semestres em que tinham desempenhado o cargo. Por exemplo: dez anos de cargo correspondem a 20 semestres o que equivale a 20 ordenados. Nada mau! Isto não deve ter chegado a assumir o estatuto de “imoralidade”, porque ninguém se terá incomodado o suficiente para que a coisa fosse suficientemente badalada e quem aproveitou...aproveitou! Pagou quem acaba sempre por pagar – os que pagam impostos!

Finalmente, e com a sexta revisão do “estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos”, a publicação da Lei 52-A/2005, de 10 de outubro, acabou com a “subvenção vitalícia”; só que, como é normal, não afetou os direitos daqueles que já a tinham adquirido anteriormente.

O problema que agora surgiu tem a ver com uma norma introduzida no Orçamento de Estado de 2015 que condicionava a atribuição da “subvenção vitalícia” aos rendimentos dos beneficiários, norma essa que foi considerada inconstitucional. Aliás, como outras normas que foram introduzidas pelo anterior governo, igualmente, consideradas inconstitucionais, acabando algumas por vigorar, a título excecional, e por tempo limitado, devido à situação financeira do país. O corte das pensões dos reformados é, constitucionalmente falando, um caso semelhante, embora me pareça ainda mais grave, visto que a reforma resulta duma carreira contributiva, enquanto a subvenção não.

O requerimento apresentado pelos 28 deputados visava, tanto quanto é público, esclarecer essa inconstitucionalidade e, obviamente, repor os direitos anteriormente adquiridos. Não vejo nisso nada de transcendente que justifique todo o alarido que se vai fazendo à volta do caso.

A imoralidade não está no requerimento agora feito!

A imoralidade está, isso sim, na Lei que permitiu e, nalguns casos, vai permitindo que estas mordomias aconteçam.

Não fora o “incómodo” de uma das subscritoras do tal requerimento ser candidata à Presidência da República e continuaríamos, alegremente, a fingir que nada se passava!

 

O.C.

05.01.16

Os candidatos presidenciais


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Faltam duas semanas para a eleição de um novo Presidente da República e a campanha, ou pré-campanha, mostrou, até agora, que os 10 candidatos não partiram, de facto, em igualdade de circunstâncias. Há os mais mediáticos, os mais e os menos conhecidos, os que são e os que não são declaradamente apoiados por partidos políticos, os que parecem ter alguma capacidade para o desempenho do cargo e os que não se sabe bem do que podem, ou poderiam, ser capazes se, porventura, fossem eleitos. Parece, portanto, fácil vaticinar que os mais conhecidos e os que têm o apoio partidário serão os mais votados. Destes, destaca-se Marcelo Rebelo de Sousa, comentador televisivo há década e meia, com apoio expresso dos partidos de direita, o mais mediático de todos. Depois o candidato do PCP, Edgar Silva, que, em princípio, contará, essencialmente, com os votos do eleitorado tradicional da CDU. Já a candidata do BE, Marisa Matias, não parece capaz de atrair todos os votantes que nas últimas legislativas preferiram o seu partido, porque, conforme entendem muitas pessoas, entre as quais me incluo, muitos desses votos foram, acima de tudo, um protesto contra os partidos do até há pouco chamado arco da governação; só que, desde outubro a esta parte, alguma coisa se modificou no que à governação diz respeito e esse sentimento de protesto também já não será, exatamente, o mesmo. Restam, dentro do grupo dos, supostamente, mais votados, os dois candidatos que se situam no campo da esquerda, dita mais moderada: Maria de Belém, ligada ao PS, mas sem o apoio do seu partido, embora apoiada por destacadas figuras da área socialista e de outros setores da sociedade e Sampaio da Nóvoa, sem ligação partidária conhecida, mas com apoio de muitas figuras de dentro e fora do PS.

Pelo que até ao momento é possível prognosticar, o desfecho de 24 de janeiro ditará que o mais votado será um destes três: Marcelo, Sampaio ou Maria de Belém.

Marcelo tem vindo a assumir uma postura de clara transformação; ele sabe que o eleitorado de direita (PSD/CDS) não lhe negará o voto; só que poderá não ser suficiente; depois de o termos visto na campanha eleitoral das últimas legislativas ao lado de Passos Coelho e Paulo Portas a defender o mesmo programa de mais austeridade para mais quatro anos, agora aparece em clara tentativa de se demarcar desses momentos e faz uma deriva para o centro esquerda, como se o passado recente, para não falar em todo o seu passado político, não tivesse existido; resta saber até que ponto os eleitores desse centro e dessa esquerda mais moderada serão capazes de pensar e agir de modo a que a Presidência da República não seja o simples prolongamento dos últimos dez anos.

As candidaturas de Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa parecem ter a sua base de apoio, essencialmente, na esquerda moderada, onde predominam os habituais eleitores socialistas e social democratas (que não se reveem no atual neoliberalismo da até há pouco coligação de direita que governou o país com as consequências que todos conhecem).

Embora todos saibamos que as candidaturas presidenciais são de iniciativa pessoal, não podemos ignorar a importância que tem o apoio partidário; em todos os aspetos; desde logo na mobilização dos eleitores e, depois, por muito que se disfarce, na logística. Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém não têm esse apoio declarado o que, por um lado, fragiliza as suas candidaturas, mas, por outro, lhes confere mais autenticidade; entendo que são candidaturas mais “genuínas”; só que, tal como no futebol, o que importa não é jogar bonito, mas sim ganhar, também em política o que conta no final do ato eleitoral é o número de votos. Estes dois candidatos estão a sofrer as consequências da habitual, diria mesmo “crónica”, incapacidade interna dos socialistas serem capazes de, em certos momentos, abdicar do que parece ser um capricho de fação em prol de interesses mais alargados; é bom que assim seja, dizem uns; algumas vezes os resultados mostram o contrário.

Por tudo isto, fica claro que Marcelo parte com muita vantagem. É o mais mediático, o mais conhecido, o candidato que a comunicação social, em especial a televisão, ajudou a criar, tem largo apoio partidário e, acima de tudo, tem facilidade de se adaptar conforme as conveniências que cada momento exige. Resta saber até que ponto os outros candidatos conseguem desmontar tudo isso e reverter a situação para que, numa segunda volta eleitoral, a maioria gerada na Assembleia da República depois das legislativas de 4 de outubro possa ter uma expressão correspondente no palácio de Belém para os próximos 5 anos.

 

O.C.